Eu receava ter perdido o ônibus, depois de passar meio dia esperando. O fiscal da rodoviária me tranquilizou dizendo que o ônibus tinha atrasado. Já vou alertando que essa viagem aconteceu antes da Pandemia. E no dia em questão, eu estava voltando para casa.
Uns 30 minutos depois do horário costumeiro o ônibus chegou. Os passageiros desembarcaram e outros foram entrando. Provavelmente eu esperei um pouco pra entrar, pois normalmente dou prioridade para os mais apressados. O motorista conferiu meus documentos e eu entrei pra ocupar o meu lugar.
Não lembro se o meu vizinho de assento entrou antes ou depois de mim, mas lembro que eu estava sentado no assento da janela e ele no do corredor. O motorista não deu a ordem pra colocar o sinto de segurança, e poucos se preocuparam com essa medida de segurança.
Muitos se sentem sufocados com a pressão natural que o cinto causa. Eu me sinto abraçado quando lembro que é essa fita preta que me impede de voar até a frente do veículo se houver algum acidente. Procurei as duas pontas do cinto e tentei engatar, mas não conseguia. Tentei por um bom tempo e estava passando vergonha prestes a sentir um fracasso pessoal.
O meu colega de assento não tinha a mesma preocupação, então eu estava quase pedindo o engate de cinto dele. Depois de muito esforço, consegui prender o meu. Mas fiquei pensando em uma situação: e se eu tivesse usado o engate de cinto dele, e acontecesse algum acidente? Provavelmente eu teria sobrevivido, e talvez ele seria uma vítima fatal. O livre arbítrio dele salvaria a minha vida.
Seria uma experiência traumática, não sei como eu reagiria, mas ele seria um mártir, pelo menos pra mim. Se nós dois sobrevivêssemos, ele ficaria indignado comigo, provavelmente porque eu teria sobrevivido ás custas dele. Mas ele recusou uma oportunidade, que poderia ter custado caro.
Eu estava voltando pra minha cidade, ele estava prestes a atravessar meio brasil, sem cinto de segurança, achei muita bravura da parte dele. Cara legal, mas guardei a carteira no bolso de trás. A viagem correu bem, me despedi dele e logo cheguei em casa. Espero que a viagem dele tenha sido boa como a minha, e que tenha continuado a vida da melhor maneira.
—
Publicado originalmente em 18 de Agosto de 2020.
Deixe um comentário