No Uber o homem pensava em como iria aproveitar sua folga. Planejava chegar em casa, abrir uma garrafa de vinho ou uma latinha de cerveja, talvez coar café. Estava farto de viajar, e o lugar em que mais desejava passar alguns dias era em casa. Não havia praia no mundo que ele deseja-se agora mais do que passar uma tarde na poltrona da sala, lendo alguns livros que havia comprado durante suas viagens e reservou para apreciá-los em casa, sem pressa e sozinho.
Ao chegar no destino o carro parou, o motorista tirou as malas com agilidade e colocou na calçada, enquanto o homem se espreguiçava. O Uber se despediu e foi embora, ele pegou duas malas e atravessou a rua. Ao abrir o portão e buscar as outras malas, parou um momento e ficou observando a cunheira da casa.
— Cadê o meu telhado? — exclamou, enquanto soltou as malas no chão e se afastou para observar melhor. Não era impressão, as telhas haviam sumido, podia ver o ripamento do telhado e o foro. Mas o portão estava cadeado e o muro era razoavelmente alto, as portas da casa estavam intactas e nada dentro dela sumiu. Duas perguntas lhe tiravam a paz:
— Por que alguém roubaria telhas se era mais fácil pegar o dinheiro e as coisas que estavam dentro da casa? Como iria explicar isso para a Polícia?
— Chamou as autoridades e registrou o Boletim de ocorrência, mas os policiais não levaram muito a sério a investigação. Passou a folga comprando mais telhas e ajudando os homens que contratou para cobrir a casa novamente.
Mas logo a polícia teve de atender outro caso parecido na cidade, e em um lugar após outro começaram a sumir telhados. Nas cidades vizinhas o fenômeno também passou a acontecer. Percebeu-se que se tratava de uma quadrilha, pois em tão pouco tempo e sem despertar a atenção dos donos das casas e de vizinhos, a quadrilha destelhava uma casa em poucas horas e até em alguns minutos.
Até que um dia a casa caiu, a polícia interceptou um caminhão com telhas roubadas de uma casa, e os detetives entraram em ação. Prenderam o chefe da quadrilha após interrogar os meliantes no caminhão. Eles tinham ficha limpa e não sabiam estar cometendo um crime, eram trabalhadores honestos que destelhavam as casas como lhes era pedido, carregavam o caminhão e as levavam até uma fazenda, de forma que os donos das casas pudessem por telhas novas. Acreditavam trabalhar em uma empresa de destelhamento.
Ao interrogar o chefe da quadrilha, descobriram o destino das telhas, na fazenda e sem a ajuda dos empregados, o meliante triturava e peneirava o pó da argila em busca de algo precioso, e depois de peneirado o pó da argila era vendida para uma olaria e usado para fazer novos artefatos de cerâmica. A polícia não conseguiu tirar do meliante a motivação do crime, ele não revelou o que procurava no pó da argila.
Anos depois, em uma cidade vizinha, um grupo de crianças brincando em um terreno baldio encontrou, em meio a um monte de entulho, uma pedra transparente e que brilhava, brilhava digamos, igual diamante.
—
Publicado originalmente em 30 de Julho de 2022.
Deixe um comentário