Tia das Orquídeas

Não era bem minha tia, é mais fácil chamar assim, ela era esposa do primo do meu pai. Um dos poucos primos dele que vinham nos visitar e com o qual eu mais tive contato. Eles moravam em São Bento do Sul, cidade em que o meu avô nasceu e onde os meus tios-avós permaneceram.

Era uma alegria quando eles apareciam, sempre de manhã, para ficar o dia inteiro. Vinham esses tios e um casal de amigos deles que também gostavam de orquídeas. Não lembro dos detalhes, se eles aceitavam um chimarrão, tomavam café com a gente ou já tinham lanchado na viagem. Mas acho que eles colocavam o assunto em dia com os meus pais e já se preparavam pra se embrenhar na mata. Eles vinham caçar, mas não com espingardas, e sim com um bambu e sacolas plásticas. Não era caça ao bicho, era caça à planta. Nós procurávamos por orquídeas silvestres, a minha tia era fascinada por orquídeas. Se alguém me perguntar se eu conheci um orquidófilo, eu vou falar dela.

Eu sempre ia junto para evitar que eles se perdessem na mata, e ajudava nas buscas.

— Achei uma aqui!

— Não é só uma, são várias.

— Meine Gott! — (Eles falavam Alemão).

— Mas tá muito alto. Traga o bambu.

Daí a gente tirava umas, outras sempre ficavam nas árvores. Nós dávamos mais uns passos entre as árvores, achávamos outras, e assim passávamos a manhã.

— Essa é muito pequena, a gente pode pegar quando tiver maior. — Era uma frase frequente.

Meus pais queriam que eles almoçassem com a gente, mas eles sempre iam no restaurante da pousada. Faziam o máximo e exageravam pra não causar despesas e transtornos. Normalmente a tarde eles iam visitar os outros parentes, e já aproveitavam pra encher mais as sacolas de orquídeas. A tarde eles voltavam pra casa. Era uma visita assim a cada meio ano mais ou menos.

Pelo que eu lembro desse primo do meu pai, ele parecia bem culto, tinha habilidade pra fazer trabalhos manuais, e era bem avançado tecnologicamente. Que eu me lembre ele era bem agitado. Falam que quando eu nem era nascido e o meu avô ainda estava vivo, esse primo tinha um “ritual” quando visitava meus avós. Depois de se despedirem, ele pegava a flauta de dentro do carro e tocava algumas músicas, isso fazia o meu avô chorar. Isso me comove porque eu não conheci esse avô, e infelizmente não ouvi o “Tio” tocando flauta.

Depois que o meu “tio” faleceu, os três vieram mais uma vez, e a tia das orquídeas me presenteou uma jaqueta. Ela me chamava de Andezom, e eu sempre fico lisonjeado quando ouço o meu nome com sotaque alemão.

Depois dessa visita nós ficamos esperando outra, mas eles não apareceram. Ano passado, passeando por São Bento do Sul, meu irmão descobriu que ela faleceu. Em novo passeio no começo do ano, no qual eu estava junto, procurando os parentes no cemitério, achamos o túmulo do casal. E claro, estava coberto por vasos de orquídeas.

Publicado originalmente em 1 de Setembro de 2020.

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