Ah, grande é o lamento do cronista quando não carrega consigo um bloco de notas e uma caneta. Tive uma boa ideia quando estava enchendo o bebedouro de água dos porcos, mas talvez não era tão boa assim, pois eu esqueci. Daria uma boa crônica, eu sentaria nessa poltrona da cozinha com o computador à minha frente, como estou fazendo agora, e desenvolveria a ideia, lapidaria esse diamante bruto. Mas uma pedra esquecida não vira jóia, então tenho que me contentar com essa outra ideia mixuruca.
Tentei lembrar, tentei mesmo, me parece ter sido algo tão bom, provavelmente alguma lembrança saudosa do passado, ou uma reflexão. Mas me escapou pelos dedos, abriu as asas e desapareceu no horizonte, me deixando aqui pesaroso. Depois de ter escrito um número razoável de crônicas, deixo de pensar muito nas que escrevi, e começo a pensar nas que eu podia ter escrito. Nas ideias que eu tive mas não anotei e ficaram ocupando gigabytes na minha memória, impossibilitando o surgimento de novas. Minha criatividade é assim, tenho algumas ideias e elas ficam solitárias por um tempo em minha cabeça, enquanto não as uso, novas não aparecem.
Mas quando tenho ânimo e escrevo mais, elas surgem cada vez mais, das mais variadas formas, porque aparecem e logo são usadas, liberando espaço para que uma nova apareça. E é o que algumas pessoas me perguntam: “De onde vêm essa criatividade?” E eu não sei como responder, pois virou um processo natural, apenas busco cada vez mais não perder as ideias que surgem. Ao contrário de quando escrevi minhas primeiras crônicas, quando várias ideias que passavam pela minha mente eram logo descartadas, e quando eu julgava uma boa, acabava estragando na hora de escrever. E fico pensando quantas crônicas teria escrito se aproveitasse todas as ideias sem exitar. Mas não posso lamentar, a criatividade é infinita e as ideias vão se renovando. Então vou escrevendo, talvez de alguma forma me ocorra novamente essa ideia, e eu publique finalmente, a crônica esquecida.
—
Publicado originalmente em 13 de Maio de 2022.