Meu pai não teve a oportunidade de me ensinar muitas coisas, mas existem aquelas das quais lembro até hoje. Me ensinou como se joga bocha, mas não da maneira convencional, com a cancha e as bolas especiais, mas me ensinou esse esporte com as minhas bolas de gude no chão da cozinha, quando ele mal podia andar.
Depois de uma chuva, me ensinou a pescar jundiá na sanga com linhas sem boia, apenas chumbada e anzol. Sentindo na linha cada “beliscada” do peixe. As melhores pescarias da minha vida. Me mostrou como usar uma foice, quando estávamos limpando o pasto.
E lembro de duas lições mais “intelectuais” que ele me mostrou. Uma que espero ter levado a sério, foi sobre a lei do desacato a autoridade. Enquanto assistíamos o jornal, houve uma matéria sobre o desacato a autoridade, e ele, sábio, aproveitou pra me ensinar: “Autoridade não é só polícia” disse ele.”Os professores e outros que trabalham pra o governo também são autoridades, e nós temos que respeitar”. Mais tarde eu descobri que em sua juventude, ele havia sofrido punições físicas na escola, muitas das quais ele achava injustas.
Outra coisa “intelectual” que meu pai me ensinou foi sobre o vento minuano. Não lembro em qual estação do ano estávamos, mas devia ser outono. Ele me disse: “escute”, enquanto olhava ao longe. Parei e prestei atenção procurando algum som. Mas apenas ouvia as folhas farfalhando e o assovio do vento. Ele perguntava se eu estava escutando, e provavelmente eu dizia que não. Até que ele disse algo mais ou menos assim : “Esse vento que move as folhas e árvores e faz esse assovio, é o vento minuano. É o vento do Inverno”.
Mas não é um vento que apenas balança as folhas e árvores, é um vento que “corta”, ai do sujeito que não estiver bem agasalhado.
Essa lição é a que eu lembro em todo outono, quando o vento minuano vai dando as caras e trazendo o inverno com ele. Quando vai ficando cada vez mais difícil sair da cama de manhã, se despedir do calor aconchegante das cobertas de lã de carneiro feitos pela vó e enfrentar o vento cortante. Quando as pastagens de verão morrem com as geadas e é preciso recolher os vasos de flor que estão ao ar livre.
Mas nem tudo são razões para odiar o inverno. Ele mata as pragas das plantações, é gentil e permite cultivarmos outras variedades de plantas, essas, mais resistentes. Dizem que os excelentes vinhos do sul se dão pelo clima da serra, resumindo, pelo frio da serra.
Aos meus olhos, o sol do inverno é mais bonito do que o de verão, tem mais cor, mais brilho, é mais aconchegante, perfeito pra ficar “lagarteando” (lição do meu avô). No inverno, o chimarrão ganha mais sabor, e o fogão a lenha é indispensável pra aquecer o corpo e assar os pinhões na chapa. Sopa de leite , a receita de gerações que quase só é feita no inverno. Esse é o sabor do inverno. Acho que essa é a lição do meu pai, o minuano também traz muitas coisas boas.
Que boas lembranças o inverno te traz?
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Publicado originalmente em 10 de Abril de 2020.