Deu tudo certo, eu estava errado!

Já esteve naquele momento da vida em que conseguiu algo que tanto almejava, ou ainda, em que algo saiu melhor do que você poderia imaginar? Sim, esses momentos são raros, geralmente as coisas acontecem contra os nossos desejos, a vida é uma eterna luta contra a correnteza. Eu por exemplo acho engraçado como o pensamento meio pessimista molda a minha vida. Um exemplo disso, é a CNH. Passei vários anos sem fazer a “Carteira”, com pensamentos bem interrogativos sobre o valor da minha existência. Não estar habilitado era uma mancha grave no dossiê das minhas capacidades. Mas agora, depois de vários fatores que deram certo, posso sair dirigindo por aí. Passei tantos anos com essa convicção de que eu não podia dirigir porque não tinha a CNH, que quando fui usufruir dela, me sentia um pouco com a consciência pesada: “Peraí, está certo isso?”, “O que o detran fez de errado?”.

Mas fui me habituando ao fato de que agora tenho a autorização que me permite chegar mais rápido aos lugares, passear mais longe e viajar com mais liberdade. Só isso já era uma enorme realização. Mas apesar da felicidade de ter essa conquista, outra “obrigação” passou a me atormentar. Agora eu não tinha mais a obrigação humana básica de conquistar a tão almejada CNH. Mas com a possibilidade de dirigir, eu queria automaticamente algo para dirigir. 

Com essa preocupação, fiquei feliz em saber que meu irmão queria vender a moto dele, e me deixou ficar com ela pra eu ir usando. Então eu estava encantado com a Habilitação e ainda por cima comprando uma moto. É uma moto simples, econômica e com peças encontradas facilmente no mercado. Mas não consegui me acostumar bem com alguns detalhes que dificultavam as minhas experiências. Não conseguia ligar direito, esquecia em que marcha ela estava, com isso precisava reduzir todo o câmbio para depois selecionar a marcha desejada. Então precisei desapegar e aceitar o fato de que tinha de comprar uma motocicleta que me permitisse ter uma experiência melhor. Mas eu sabia que não ia conseguir comprar uma com pouca quilometragem, partida elétrica e um visual moderno. E como às vezes os pessimistas não têm razão, eu estava errado… 

Novamente, várias coisas se encaixaram para que eu sentisse que estava em um sonho, e que logo iria acordar. Depois de sacrificar minhas economias e assumir o restante das parcelas de um financiamento, consegui uma moto boa, bonita e com pouca quilometragem. Até hoje estou custando a acreditar, mas com o tempo vou aceitando que isso é sim, realidade. Essa dificuldade em assumir que algo tão bom está acontecendo comigo, me faz lembrar que um monte de coisas pode dar errado, e essa insegurança não é tão ruim.

Várias pessoas ficaram preocupadas com a minha integridade física, afinal, a cabeça é o para-choque do motociclista. Mas eu acho engraçado que, por eu dirigir apenas bicicletas por tantos anos, andar a trinta, quarenta quilômetros por hora sem pedalar já é uma grande conquista. E pulando um pouco a questão da minha própria integridade física, sempre lembro que estou dirigindo algo que eu nem sei como consegui. Um sonho de 300 quilos, que a qualquer descuido pode desvalorizar um monte, exigir reparos dispendiosos ou ainda virar sucata. E agora sim, sobre a minha integridade física, se os outros argumentos não forem tão convincentes: eu nunca quebrei um osso (até onde eu sei). Não sei como é ter uma fratura interna ou exposta, e espero nunca saber. Lembro com dor de alguns machucados que passaram longe de ser consequência de um acidente com moto. Então sempre concluo que a velocidade atrelada a qualquer descuido pode resultar em duas coisas que são extremamente desagradáveis pra mim: prejuízo financeiro e desconforto físico. E como expressa a Lei de Murphy: “O que pode dar errado, vai dar errado!” Então faço o possível para que a possibilidade de algo indesejável acontecer seja muito reduzida, junto com a probabilidade de eu acordar desse sonho direto dentro de um pesadelo.

E existe o fator emocional. Essa é a minha primeira moto, e eu costumo me apegar fácil a coisas assim. Fico preocupado com trancos e quando o motor ronca mais que o necessário, como por exemplo hoje, quando o câmbio caiu no neutro e eu cortei giro sem querer. Tempos atrás o motor roncava um pouco mais nas reduções de marcha, e eu já ficava preocupado com o desgaste desnecessário que isso poderia causar no motor. Até que descobri que é preciso equilibrar a rotação do motor com a velocidade da roda na hora de soltar a embreagem. E esse é apenas um exemplo de que apesar de um tempinho habilitado, ainda estudo as melhores formas de preservar cada componente durante a pilotagem. Porque é claro, vai dar algo errado,  e faço o possível para que seja a menor das desgraças. 

Fiquei aficionado pelo conceito de durabilidade. Do motor, caixa, embreagem e pintura. Pesquiso com frequência sobre filtros de ar, de óleo e combustível. Além de produtos de limpeza, brilho e protetores contra a luz do sol. E mesmo antes de ter essa conquista, não via sentido em “cortar giro”, “dar grau”, ou semelhantes. E agora fico ainda mais impressionado com o pouco apego dos praticantes dessas exibições pelos bens materiais. Não que eu seja materialista, mas não vejo graça em correr riscos desnecessários, porque sei que às vezes, os pessimistas tem razão.

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